No artigo, Célia Schlithler, diretora de Desenvolvimento Comunitário do IDIS, fala sobre o desafio de dar escala aos investimentos sociais privados. Um tema que deve entrar na agenda de discussões de representantes dos três setores da sociedade.
O volume de recursos alocados por institutos e fundações empresariais em ações sociais já é significativo e vem crescendo nos últimos anos. O estudo Ação Social das Empresas, realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), aponta que 69% das empresas brasileiras (quase 600 mil) destinaram cerca de 4,7 bilhões de reais (0,27% do PIB) para fins públicos em 2004. Porém, a demanda social do país ainda é enorme, por isso é essencial que representantes do setor público, privado e terceiro setor desenvolvam estratégias para potencializar os efeitos de iniciativas bem-sucedidas.
Nesse cenário, a criação de tecnologias sociais facilmente reaplicáveis pode ser encarada como um caminho a ser traçado, inclusive com a contribuição da comunidade acadêmica. Mas é preciso salientar que o processo de multiplicação não pode ser a simples duplicação mecânica de uma metodologia em diversas localidades, ou replicação das soluções. Para alcançar bons resultados, as iniciativas devem ser adaptadas às características de cada comunidade em que elas serão implantadas.
Como afirmou Jacques Pena, presidente da Fundação Banco do Brasil, durante o 5º Congresso Gife sobre Investimento Social Privado, o monitoramento de milhares de iniciativas pontuais é difícil e caro. A melhor alternativa é a instituição oferecer produtos, técnicas e metodologias reaplicáveis a outras pessoas e organizações. Isso estimula a apropriação dessas ferramentas por diversas comunidades e gera a escala pretendida. Andrés Thompson, diretor de programas da Fundação Kellogg para América Latina e Caribe, vai além. Para ele, a consciência da mudança é mais importante do que a tecnologia social em si. Por isso, defende que idéias sejam disseminadas, não apenas projetos ou tecnologias sociais.
Exemplos a seguir
Duas organizações que estão obtendo bons resultados com a reaplicação de suas metodologias são o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e própria a Fundação Banco do Brasil. Por meio do programa 1 Milhão de Cisternas, o Unicef, com a organização da sociedade civil Articulação do Semi-árido Brasileiro (ASA), construiu 222 mil cisternas no Nordeste, até o final de 2007. Esses equipamentos beneficiaram mais de 1 milhão pessoas em 1.031 municípios. A organização pretende implantar um milhão de cisternas, beneficiando 5 milhões de pessoas até 2010.
Já a Fundação Banco do Brasil usou a estratégia para aplicar 146 milhões de reais no Nordeste brasileiro entre 2003 e 2007. As tecnologias dos programas Água Doce (dessalinizadores de água e técnicas sustentáveis no semi-árido), Produção Agroecológica Integrada e Sustentável (práticas de agricultura sustentáveis), Uma Terra e Duas Águas (alternativas de captação de água) e Saneamento Básico Rural (substituição de fossas negras por fossas sépticas biodigestoras, que produzem adubo orgânico) foram reaplicadas nos estados da região.
Quando uma instituição deseja reaplicar sua metodologia, o mais recomendado é que ela pense no assunto durante o planejamento da ação. Nesse momento, é mais fácil encaminhar a iniciativa rumo à criação de uma tecnologia social. Isso não significa, porém, que seja impossível extrair uma tecnologia de uma metodologia já existente.
Um bom exemplo disso é a experiência do IDIS com o programa de Formação de Redes para a Educação Infantil (REDINs). A iniciativa nasceu de um projeto piloto, realizado em Belo Horizonte em 2003. Depois, ele foi expandido, reaplicado e aprimorado em outros municípios graças ao financiamento de parceiros. Hoje, o programa rende ao instituto uma metodologia consolidada de formação de redes intersetoriais em prol do desenvolvimento comunitário. Mas a iniciativa ainda não se apresenta como um modelo de reaplicação autônoma, isto é, que funcione sem a orientação direta do IDIS.
O esforço do IDIS agora vai no sentido de transformar o conhecimento adquirido em metodologia de fácil apropriação e aplicação em quaisquer comunidades. Serão criadas propostas que unam simplicidade de reaplicação e participação comunitária.