Por André Rodrigues de Lara*
Vivemos em um mundo extremamente desigual, que vem aprofundando essa desigualdade ano após ano, o que comprova que o sistema econômico e fiscal vigente está estruturado para elevar a concentração de renda. O relatório “Tempo de Cuidar” da Oxfam, organização da sociedade civil que atua no combate à desigualdade, pobreza e injustiça social, lançado às vésperas do Fórum Econômico Mundial deste ano, trás dados estarrecedores da desigualdade no mundo. Em 2019, apenas 2.153 indivíduos mais ricos do mundo detinham mais riqueza que 4,6 bilhões de pessoas. Os 22 homens mais ricos do mundo detêm mais riquezas que todas as mulheres que vivem na África. Se todas as pessoas do mundo empilhassem seus recursos financeiros em notas de 100 dólares e sentassem em cima, a maior parte da humanidade ficaria sentada no nível do chão, as pessoas de classe média de um país rico ficariam sentadas no nível de uma cadeira enquanto os dois homens mais ricos do mundo estariam sentados além da estratosfera, no espaço sideral. Embora todos essas comparações sejam alarmantes, o dado que mais me impressionou foi que o valor monetário global do trabalho de cuidado não remunerado prestado em sua maioria por meninas, adolescentes e mulheres é de pelo menos US$10,8 trilhões por ano, isso significa que se essa riqueza fosse gerada por um país seria a terceira maior economia do mundo, bem perto do PIB chinês. Esse montante não pago a essas mulheres e meninas sustenta parte da economia mundial e a maior parte dessa fatia está indo para os mais ricos. São mais de 12,5 bilhões de horas de cuidados diárias em tarefas como cozinhar, limpar, buscar água e lenha, cuidar de idosos, outras crianças ou parentes debilitados entre outras atividades que são essenciais.
Esse cenário de desigualdades vem se aprofundando ao longo dos anos e cada ente da sociedade (indivíduos, organizações, empresas e governo) tem seu papel no combate a esta situação. Um primeiro passo é ampliar a consciência, entender o que está acontecendo, como esse mecanismo está estruturado e os impactos que essa desigualdade profunda trás, e trará cada vez mais, para o mundo e consequentemente para si e para o seu entorno. A partir dessa reflexão, podemos compreender como nossos diferentes papéis – eleitor, consumidor, empregado, empregador ou cidadão – influenciam essa dinâmica, para então traçar um plano para mudar hábitos e atitudes que causem efeitos positivos no mundo que desejamos viver.
A mesma reflexão serve também para empresas e organizações. Ao avaliarem sua estratégia de negócio, sua atuação, sua cadeia de valor, seu entorno, suas relações com o poder público e suas ambições de futuro, devem incluir nessa análise metas claras não mais de mitigação de danos, mas sim de efetivos esforços para causar um impacto positivo, trazendo benefícios para a sociedade. Talvez você se pergunte: “Mas por que uma empresa deve pensar em causar impacto positivo se já gera empregos e paga seus impostos?”, minha pequena contribuição para esclarecer esse questionamento é que além da sua intrínseca responsabilidade social e necessidade de licença social para operar, devemos entender que hoje é uma estratégia de sobrevivência contribuir para um mundo mais equilibrado e justo ambiental, social e economicamente. Os impactos econômicos da desigualdade e dos desequilíbrios ambientais afetarão as empresas. Os mercados consumidores, mão de obra qualificada, acesso a recursos e insumos e legislações cada vez mais rigorosas são alguns dos fatores ligados à desigualdade e aos impactos ambientais que as empresas terão que lidar. Todos nós temos uma decisão a tomar, que papel queremos ter na solução deste problema? É preciso agir para reduzir a desigualdade.
* André Rodrigues de Lara é Gerente de Projetos no IDIS