A partir de uma sondagem qualitativa realizada pelo IDIS durante o segundo semestre de 2009, o artigo discute o impacto da crise econômica sobre o investimento social privado.
O que uma crise econômica tem a ver com o investimento social privado? Simples: uma economia pujante proporciona mais recursos para as empresas e os indivíduos de alto poder aquisitivo investirem em ações socioambientais. Ainda não há uma projeção de quanto a instabilidade financeira mundial de 2008 e 2009 influenciou no corte desses investimentos. Uma análise, porém, é certa. A falta de solidez na economia serviu como um gatilho para as empresas refletirem sobre sua atuação.
Durante o segundo semestre de 2009, o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS) realizou uma sondagem qualitativa junto às empresas e institutos. Por questão de sigilo, os nomes não são divulgados.
O objetivo do estudo foi coletar informações sobre o impacto da crise no investimento socioambiental privado. Os setores pesquisados foram varejo, agronegócio, energia, farmacêutico, indústria de papel e de celulose, além de famílias e indivíduos de alto poder aquisitivo.
As entrevistas tiveram perguntas estruturadas, que buscaram respostas em três dimensões dos investimentos socioambientais: o impacto da crise, o valor do tema para a empresa e os planos e as tendências.
As companhias, de forma geral, alegaram perda de recursos financeiros no negócio durante o período de baixa na atividade financeira. Em relação aos investimentos socioambientais, houve manutenção de seus compromissos, não ocorrendo cortes desenfreados, mas a readequação dos orçamentos frente ao cenário econômico. Uma parcela das empresas manteve os mesmos valores destinados a projetos de interesse social e ambiental, sem qualquer aumento em comparação a 2008. Os orçamentos para área em 2010 também não devem ser maiores.
Postura corporativa
O traço mais importante detectado na pesquisa é a percepção de uma mudança de postura. As empresas investidoras decidiram fazer uma profunda avaliação de suas práticas e do foco do investimento. As análises estão previstas para 2010.
Os principais questionamentos do investidor social são os seguintes:
- O quanto os projetos e programas apoiados estão sendo eficientes?
- A empresa é reconhecida por suas ações?
- Quais os reais impactos que estão sendo gerados?
O momento de crise provocou uma reflexão e estimulou o olhar mais cuidadoso. Isso reflete tanto a maturidade do setor sobre os seus programas de investimento socioambiental quanto a sua contribuição positiva para a sociedade brasileira e as comunidades onde estão presentes.
A relação entre a cultura de sustentabilidade e a de investimento social privado é direta e a sondagem qualitativa reforça ainda mais esse entendimento. Quanto mais a primeira fizer parte dos valores corporativos, mais forte será a segunda. Além disso, propiciará melhor integração das estratégias de investimento social com as de negócio da empresa, envolvendo toda cadeia de valor e trazendo mais perenidade às iniciativas. Assim, o investimento não é visto apenas como um custo.
Os processos de gestão, muitas vezes aplicados apenas aos negócios, mais que antes passaram a integrar o universo do investimento social privado. Para o futuro, serão as ferramentas que as empresas utilizarão para realinhar o foco e medir o real impacto socioambiental do seu apoio.
Investimento de famílias e indivíduos
Na sondagem qualitativa, o IDIS verificou que a as doações de famílias e de indivíduos de alto poder aquisitivo (mesmo com a ausência de tradição do país na área), não tiveram seus compromissos e volumes necessariamente afetados pelo humor do mercado.
Com motivações e gestão distintas do universo corporativo, os programas de investimento social de famílias e de indivíduos tendem a ter uma visão de longo prazo, se comparado o ambiente corporativo de planejamento e de orçamentos anuais com revisões trimestrais. Isso traz mais estabilidade para os programas de investimento social nesses momentos de crise.
Na outra ponto do fio
As organizações da sociedade civil, em contrapartida, sentiram o reflexo tanto da redução de recursos financeiros, quanto do aumento do rigor no planejamento, na avaliação e na sustentabilidade dos projetos.
A adoção de uma gestão qualificada e eficiente, com a diversificação das fontes de renda e de financiamento, foi o grande desafio para o setor em 2009 e é o que se espera ocorrer em 2010.
O balanço é de que empresas, investidores sociais e as organizações da sociedade civil foram afetados com a redução dos recursos – e, em alguns casos, até resultou na extinção de programas e de instituições. Apesar de tudo, o setor sai mais fortalecido, buscando mais eficiência e estratégias que tragam mais sustentabilidade para programas e projetos.