O Brasil caiu oito posições em relação ao ano passado e ocupa agora o 91º lugar entre 135 países no “ranking de solidariedade”, uma iniciativa da organização inglesa Charities Aid Foundation (CAF) e do Instituto Gallup.
Os dados são do World Giving Index 2013, lançado mundialmente nesta terça-feira (3 de dezembro) para coincidir com o Giving Tuesday, data criada para incentivar doações em países como Estados Unidos e que se espalhou para o Canadá, Singapura, Austrália, América Latina e outros países. O IDIS, parceiro brasileiro da CAF, realizou um evento no Centro Ruth Cardoso, em São Paulo, para apresentar e debater os resultados.
A queda do Brasil no ranking é ainda maior em comparação a edições anteriores. Em 2009, o país era o 54º no World Giving Index. Em relação a outros países da América do Sul, o Brasil também vai mal: é o último, junto com a Venezuela. No continente, Chile e Colômbia estão empatados em primeiro.
O Instituto Gallup abordou 155 mil pessoas em vários países. Para avaliar o comportamento solidário, perguntou se, no mês anterior à aplicação do questionário, o entrevistado doou dinheiro, ajudou um estranho ou foi voluntário em alguma organização. O índice é composto por esses três aspectos.
No Brasil, 42% dos entrevistados disseram ter ajudado um estranho no mês anterior (90ª posição nesse quesito), 23% afirmaram ter doado (72ª posição) e 13% ajudaram um estranho (90ª). Ainda assim, ao extrapolar a amostra para toda a população e estimar o número absoluto de “solidários”, o Gallup pôs o Brasil entre os dez primeiros em todos os comportamentos. São 63 milhões que ajudaram estranhos (quinto maior contingente do mundo), 34 milhões que doaram dinheiro (oitavo maior) e 34 milhões de voluntários (nono).
“Existe em nosso país grande desconfiança em relação ao terceiro setor, causada, principalmente, pelos escândalos envolvendo transferências de recursos irregulares a organizações sociais”, afirmou a diretora-executiva do IDIS, Paula Fabiani, ao falar sobre a posição brasileira.
Neste sentido, o presidente do Instituto Arredondar, Ari Weinfeld, disse que, “para o investidor, a doação precisa ser fácil, segura e dar retorno”. Ele ainda ressaltou a necessidade de mais transparência no setor para garantir credibilidade.
Paula também observou que o incremento da renda dos brasileiros não tem se refletido em comportamento donativo: a percepção de que os mais pobres estão melhorando de vida levaria os mais ricos a diminuir a ajuda. “O mundo está economicamente mal, mas as doações subiram. Já o Brasil está economicamente bem, mas as doações caíram”, complementou Weinfeld.
Já o diretor do Instituto Doar, Marcelo Estraviz, iniciou sua fala dizendo ser um otimista, e ressaltou que os números absolutos mostram que, “ao redor de cada um de nós, há uma pessoa que doa”. Ao mesmo tempo, apontou a necessidade de criar uma cultura de pedir doações.
Surpresas no ranking
Os Estados Unidos recuperaram a liderança do ranking, posição que ocuparam em 2011, mas que haviam perdido para a Austrália no ano seguinte. Já os australianos caíram, em 2013, para o 7º lugar. Entre os 20 primeiros do índice há países de cultura de doação consolidada, como Canadá (2º), Nova Zelândia (também em 2º), Reino Unido (6º) e Holanda (8º). A surpresa fica por conta de nações como Mianmar (2º), Sri Lanka (10º), Líbia (14º) e Nigéria (20º). Em Mianmar, 85% dos entrevistados relataram ter feito doações no mês anterior à pesquisa, colocando o país no primeiro lugar para esse comportamento, à frente dos Estados Unidos.
Segundo Paula Fabiani, os dados mostram que “a riqueza de um país não necessariamente se traduz em solidariedade, pois Mianmar, por exemplo, é uma economia pequena, já a China é a segunda economia, mas não está entre os 20 primeiros”. De fato, apenas cinco países do G-20, grupo que reúne as maiores economias do planeta, estão entre os 20 primeiros.
Já o posicionamento da Líbia, segundo o relatório, reflete algo já percebido em pesquisas anteriores. O país se destacou no quesito a ajuda a pessoas estranhas (comportamento relatado por 72% dos entrevistados), repetindo um fenômeno observado em estudos anteriores: o auxílio a desconhecidos tende a aumentar em territórios pós-conflitos, como já ocorrera com Serra Leoa e Libéria.
O relatório também mostra o descolamento entre desempenho econômico e ação solidária ao apontar que os três componentes do índice registraram aumento de 2011 para 2012, enquanto a economia mundial retraiu-se no período.
Houve também o destaque no comportamento dos jovens entre 15 e 24 anos, faixa etária que, em 2008, menos participava de atividades voluntárias. Em 2013, ela passou para o segundo lugar nessa prática – atrás apenas daqueles com 35 a 49 anos. Mais ainda, com 20,6% de participação voluntária, foi a única faixa etária a superar seu pico de 2008. Todas as outras continuam abaixo da participação recorde daquele ano.
Para Weinfeld, isso salienta a necessidade de usar ferramentas tecnológicas para atrair a juventude ao terceiro setor. Paula, por sua vez, lembrou outro estudo da CAF sobre a importância de incentivar o altruísmo já na escola. Estraviz afirmou ter “esperança não em nós, mas nos jovens que têm outra forma de entender a ação social, mas que ainda não têm o dinheiro para doar”.