Um relatório recente da Oxfam, organização britânica de combate à pobreza, indicou que 1% da população detém 48% da riqueza mundial – e que a tendência é que essa fatia chegue a 50% em 2016. O paradoxo é que essa pequena elite econômica pode ser parte da solução para reverter a trajetória de concentração.
Uma das maneiras é por meio do investimento social privado (ISP). “O ISP consegue amenizar muito o problema e ter um impacto social brutal, caso os recursos sejam bem manejados”, afirma Marcos Azzi, fundador do Instituto Azzi, organização da sociedade civil especializada no aconselhamento a investimentos sociais de pessoas e famílias de alta renda. “Imagine um bilionário que doe 1% de seus ganhos anuais para a filantropia. É nada em termos do que ele tem, mas é muito em valores absolutos”, comenta Azzi.
A questão passa, então, por atrair tal público para o investimento social privado. Um trabalho considerável, a julgar pela experiência de Azzi em São Paulo, onde o instituto atua — a cidade abriga o sexto maior número de bilionários no mundo, à frente de Paris, Los Angeles e Genebra, segundo uma pesquisa do banco suíço UBS e da consultoria Wealth-X. “Em geral, é um grupo que se aliena do coletivo, vive numa ilha de bonança”, diz. “É aberto para ouvir, mas acaba ficando meio que por isso mesmo”.
Para a diretora-executiva do IDIS, Paula Fabiani, “o grupo de milionários e bilionários brasileiros é muito heterogêneo; alguns são engajados e outros nem tanto”. Ela avalia que falta, no país, uma cultura de doação consolidada: “Pelo que podemos ver no World Giving Index 2014, publicado pela CAF, o Brasil não tem uma cultura de doação, ocupando a 90ª posição em um ranking de 135 países. É claro que as camadas mais ricas da população também partilham desse mesmo comportamento”.
Além do investimento social privado, há outro modo de o 1% colaborar para reverter a concentração, segundo o diretor da Oxfam no Brasil, Simon Ticehurst: as pessoas de alta renda precisam parar de sustentar políticas que contribuam para a desigualdade. “Elas influenciam indevidamente o processo político-democrático, conseguindo benefícios do poder público, como vantagens tributárias que mantêm um sistema fiscal no qual quem tem mais paga proporcionalmente menos”, diz Simon, ecoando uma parte do relatório da Oxfam, divulgado em janeiro, que fala justamente sobre os grandes gastos com o lobby sobre questões tributárias.
Ticehurst argumenta que o público de alta renda está, na verdade, agindo contra seus interesses ao apoiar medidas que resultam em concentração de renda. “No longo prazo, é de interesse deles também ter um sistema mais igualitário, pois sociedades mais iguais são comprovadamente mais seguras.” Paula reforça: “No Brasil, as pessoas, por mais privilegiadas que sejam, convivem diretamente com os problemas sociais, ao contrário do que acontece em outros países mais desenvolvidos. Em qualquer parte, somos obrigados a olhar nos olhos da pobreza e da injustiça.”